Boletim Arte na Escola

Aprendizado das linguagens da área de Artes será cobrado em avaliações sobre a qualidade do ensino
A. Rodchenko. Knigi (Livros), 1924. Poster. © A. Rodchenko, V. Stepanova Archive, Moscow House of Photography Museum. Imagem com intervenção à direita.

Algumas escolas já começaram a considerar as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica, lançadas no final de 2013 pelo Ministério da Educação (MEC), que destacam as linguagens da área de Artes: Artes Visuais, Música, Dança e Teatro. Segundo o MEC, as escolas têm autonomia para definir a carga horária e selecionar os professores e a forma como esses conteúdos serão trabalhados. A instituição alerta, porém, que o aprendizado será cobrado em avaliações como a Prova Brasil, o ENEM ou o SARESP em São Paulo.

Será que os professores se sentem preparados para aceitar este novo direcionamento? Fomos a campo para descobrir.

Alesandra Inez Darui Pinheiro, professora de artes na Escola Estadual de Ensino Médio Emil Glitz, de Ijuí/RS
Estou trabalhando com projetos pontuais nas artes visuais, não me sinto segura para dar aulas nas outras modalidades (dança, teatro e música). Acho que é possível passar pelo assunto, mostrar como essas habilidades artísticas estão conectadas, mas os conceitos estruturantes dessas disciplinas eu não tenho. Não é só questão de estudo, é preciso ter habilidade e vocação. Além disso, acredito que o professor deve atuar na sua área de formação. Usar um profissional de artes para dar aulas de teatro, dança e música é banalizar esses conteúdos. Se eu não tiver conhecimento sobre o que estou ensinando a aprendizagem não vai acontecer. Não podemos aceitar essa inversão de valores na educação.

Ademir de Castro, professor de artes da Escola Municipal de Ensino Básico Rotary Club, de Jundiaí/SP
Acredito ser importante, para o trabalho em arte na escola, que as crianças vivenciem e se expressem por meio das mais variadas linguagens. Penso que a arte é o principal veiculo de expressão da subjetividade humana, então essas vivências, além de despertarem a curiosidade e a criatividade, educam os sentidos.
Nós, humanos, somos seres de cultura, entretanto as crianças estão muito expostas aos meios de comunicação de cultura de massa. Sendo assim, é papel da escola se contrapor a esta situação oferecendo, além do espaço expressivo, o contato com elementos da cultura, possibilitando que apurem seu gosto e sua sensibilidade.
Nesse sentido, me sinto confortável em trabalhar as múltiplas linguagens, visto que sou um mediador que possibilita que o outro se expresse de modo criativo. Procuro ampliar meu repertório e meu olhar com outros parceiros no conhecimento sistematizado sobre o assunto e nas minhas experiências criativas para planejar as situações de aprendizagem.

Ariadne Samara Azevedo Cruz Farinea, professora de artes das escolas Associação Pestalozzi (Educação Especial) e Escola Municipal José Rodrigues Benfica, de Campo Grande/MS
A ampliação do currículo de artes nas escolas é um grande avanço cultural, porém é preciso tomar cuidado na hora de levar os conteúdos para a sala de aula. Tenho formação em artes, faço teatro há 10 anos, toco percussão e violão e, por ter essas vivências, conheço um pouco de dança também, por isso me sinto à vontade para trabalhar essas disciplinas com meus alunos. Por outro lado, vejo muitos professores com dificuldades, uma vez que não tivemos essa formação na faculdade, e esse conhecimento não é algo que se adquire pesquisando aulas na internet, é preciso estudar cada matéria a fundo. Não adianta incluir no currículo básico escolar e pedir a polivalência dos professores nos concursos, como já vem sendo feito, se as matérias não estiverem presentes na universidade. Para ensinar é preciso ter vivência e conhecimento.

Conceição Aparecida da Costa, supervisora pedagógica de Arte da Prefeitura de Jundiaí/SP
Agora os professores poderão atuar de forma global, mostrando para as crianças e os jovens as diversas possibilidades de artes e como elas estão interligadas. A área ganhou relevância. Antes a equipe municipal tinha 12 professores, hoje são 48, alguns com formação em música e teatro. Para ajudá-los em sala de aula, oferecemos formação nas quatro linguagens e realizamos reuniões semanais. Na educação infantil, além do professor de arte, temos o oficinista de música e um professor de jogos e brincadeiras. O nosso objetivo é mostrar como todas as habilidades estão entrelaçadas, sem fragmentações ou rótulos, e oferecer aos professores o suporte necessário com cursos e material didático de qualidade.

Maria de Fátima Mourão de Oliveira Vit, professora de artes e educação infantil em Fortaleza/CE
Acho vital para qualquer pessoa ter contato com as artes e essa inclusão no currículo da educação básica só traz benefícios para a formação futura das crianças. As aulas de artes proporcionam uma maior percepção de vida aos alunos, que ficam mais críticos, mais conscientes sobre a sociedade e o próprio corpo e aprimoram o vocabulário.
Como atuo na educação infantil e tive aulas de teatro e música na minha adolescência, não tenho problemas em usar esse conteúdo em sala de aula, e se isso for incluído na formação dos professores, melhor ainda. Atualmente faço aulas de desenho e pintura e aconselho a todos, não só os professores, a mergulharem profundamente na história da arte. Tenho certeza de que quem vai atrás desse conhecimento nunca mais será mesma pessoa.

Maria Regina Johann, professora de artes da Unijuí, de Ijuí/RS, e coordenadora do Polo Arte na Escola na mesma instituição
A nossa política pública é um paradoxo. Primeiro criam a demanda para depois pensarem como isso irá funciona na prática. Se fizermos hoje um concurso para suprir a demanda de professores para essas disciplinas (teatro, música, dança) não iríamos conseguir preencher as vagas. Isso não significa que não devemos ampliar o currículo, é importante o aluno ter contato com as diferentes linguagens da arte e que eles possam se expressar por meio delas, mas é preciso respeitar as especificidades de cada uma, com sua metodologia e didáticas diferenciadas. Temos um déficit histórico: algumas áreas do conhecimento têm soberania sobre as outras. Por exemplo, a área de humanas sempre teve menos valor social do que a de exatas. Não existe uma matéria mais importante do que a outra e acredito que os professores precisam ter formação na sua especialidade. Porém, não descarto rever a estrutura curricular do curso universitário de artes para incluir essa nova demanda. Acho que esse é o nosso grande desafio. A única coisa que não podemos é fazer experiências com a educação.

Rosilene de Lima Neves, professora de artes da Escola Municipal Maria Gertrudes Mota de Lima e Escola Estadual Carlo Cassadio, de Boa Vista/RR
Achei excelente a oportunidade de ampliar o conteúdo das aulas de artes com a música, a dança e o teatro. É muito importante colocar a questão da interdisciplinaridade na sala de aula, mostrar aos alunos como os assuntos estão correlacionados, que você pode trabalhar com ritmos e ao mesmo tempo com os movimentos do corpo. Uma característica nossa é não importar a cultura de outros lugares, gostamos de trabalhar com a nossa realidade e isso faz todo o sentido para os alunos. Por isso, não senti nenhuma dificuldade em agregar os novos conceitos e não vejo isso também nos outros professores. Temos um grupo de estudo onde podemos trocar experiências e compartilhar ideias e tem sido ótimo.

Essa experiência não está limitada à nossa disciplina: propusemos uma atividade em que os alunos tinham que criar uma nova letra para uma música que eles escolhessem. Além de ritmo, isso passa pela habilidade de escrever, que é outra disciplina. Tudo isso tem sido um grande aprendizado para nós, principalmente porque o assunto encanta os alunos e eles trazem conteúdo para aulas. Ou seja, aprendemos juntos, o que é muito estimulante.

Em sua opinião, as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o ensino de arte são aplicáveis na atual estrutura educacional? Deixe o seu recado.

Comentários Deixe o seu comentário

  • Tatiana Prado Massura Delfino, 22:09 - 06/06/2014
    Sou formada em Artes Visuais mas sempre procurei trabalhar as demais vertentes previstas no PCN. Fiz 18 anos de ballet clássico, aulas de teatro e casei com um músico!! Acabei passando por experiências artísticas ao longo da vida que me completaram como educadora da área de Arte. Em minhas aulas procuro sempre garantir que meus alunos passem por vivências artísticas significativas e, a partir delas, possam viver a Arte. A possibilidade de trabalhar com todas as áreas só agrega valor ao sentido e ao papel da Arte na escola. Percebo também que aos poucos os alunos vão internalizando novos valores, conceitos e vocabulários... Relacionam conhecimentos e ampliam saberes. A arte permeia tudo e envolvê-los nas quatro linguagens garante o desenvolvimento integral do indivíduo.
  • Marcilio de Jesus Conceição, 23:30 - 07/06/2014
    O que há de novo? O Currículo de Arte do Estado de São Paulo já contempla as quatro linguagens no seu Caderno, inclusive para os anos iniciais. O professor de Arte não forma artistas, e sim, propõe reflexão sobre as atividades artísticas através da apreciação, fruição e contextualização da linguagem. Por isso, não precisamos ter medo!
  • Meire Regina de Lima, 18:26 - 11/06/2014
    Sim, as Novas Diretrizes Curriculares são aplicáveis na nossa estrutura educacional e não me assustam. Minha primeira graduação é em Artes Cênicas, mas no meu cotidiano fui impelida a trabalhar muito com Artes Plásticas. Como estudei um pouco de música também me sinto a vontade de trabalhar essa linguagem e, todas as vezes que me senti insegura busquei aprender, foi assim que fiz meu mestrado, pós-graduação e faço agora outra graduação, sempre com a intenção se enriquecer meu repertório e ampliar as possibilidades em meu trabalho.

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