Os alunos do 2º ano do Ensino Fundamental I do professor Paulo Lorenzeti não conseguiam se concentrar na sequência didática proposta para aquele dia, desenhar. Tudo porque um solitário marimbondo tinha decidido construir, em plena sala de aula na Escola Estadual Diva Gomes dos Santos, a sua morada. Sem dar conta da curiosidade, o pequeno Marcos Daniel disparou: “Professor, o que é aquilo?”.
O ninho do inseto – e a observação atenta do professor e dos estudantes – motivou o projeto vencedor na categoria Ensino Fundamental I do XV Prêmio Arte na Escola Cidadã, “Estudos sobre casas: formas de habitar a arte”, que abarcou múltiplas linguagens e disciplinas como artes visuais, música, dança e literatura, produção de textos, biologia, matemática etc. “Buscamos casas de insetos e animais no ambiente escolar, de vespas, aranha, caracol, caramujo e até ninho de passarinho”, recorda o professor. “Cada uma que encontrávamos motivava atividades e pesquisas abordando diversos elementos: o estudo das formas, incluindo obras de artistas, as materialidades, aspectos construtivos, fazendo sempre um paralelo com a construção das obras de arte e seus elementos visuais”. Os alunos também vivenciaram experiências corporais por meio de jogos e brincadeiras, associadas às formas ou aos temas estudados. “Quando você escuta a criança desperta nela a vontade de participar. Se você abre esse espaço, abre o mundo para o conhecimento”, afirma Paulo.
Trava-língua
Um dos pontos altos do projeto foi o “nascimento” do Marivesaracolujo, habitante das casas que o grupo foi pouco a pouco reunindo. “O nome, formado pelas iniciais dos insetos (marimbondo, vespa, aranha, caracol, caramujo) é um trava-língua, uma forma de brincar com as palavras utilizadas para estimular a inteligência e o raciocínio lógico por meio do lúdico”, explica Paulo. Logo o personagem “de cara expressionista e olhar cubista” passou a provocar os estudantes por meio de cartas, ganhou uma máscara criada a partir do desenho de um aluno, música própria e muita admiração. “Trabalhos assim fazem o aluno se interessar e gostar da aula", garante o professor.
Para rever os percursos de aprendizagem e congregar todos os novos conhecimentos, Paulo e os alunos criaram, conjuntamente, uma música sobre a construção de casas. “Se abrir para o aluno é encontrar caminhos para eles e para mim, pois estou aberto para aprender”, pontua o professor. “Parafraseando John Dewey, uma experiência só é estética quando une cognição, afeto e vida. Ter como ponto de partida a curiosidade dos alunos com relação aos elementos da natureza presentes no ambiente escolar e adentrar nos mais vastos conhecimentos é uma maneira de compreender que as coisas têm uma interligação e que é necessária explorá-la para criar um trabalho mais integrador.”
Paulo registra as vivências em sala de aula em cadernos, que possibilitam não apenas que ele reflita sobre a sua prática, mas que acompanhe o desenvolvimento dos alunos. “Eles me presenteiam com desenhos, músicas, e guardo tudo nestes cadernos, bem como frases ditas em nossos percursos”, aponta. “As crianças passam a observar o mundo de uma forma mais atenta, enxergando arte em lugares inesperados. Já ganhei um pedaço de pão francês e outro de arame, cuidadosamente levados para escola porque tinham o formato espiralado, semelhante à casa do caracol que estávamos estudando. É gratificante perceber como as crianças se relacionam esteticamente com o mundo ao seu redor a partir dos estímulos das aulas."
Por Regina Ramoska
Saiba mais sobre o projeto assistindo ao documentário.